Crítica de José Alexandre Oliveira

 

É certo que em 2019 ninguém mais se surpreende com filmes que pertençam a um mesmo universo. A grande responsável por isso: a Marvel. O estúdio consolidou ao longo dos últimos dez anos esse tipo de experiência e cada espectador vai ao cinema caçando referências aos filmes anteriores e ganchos para os próximos. Antes dela, vale destacar George Lucas. Ele já flertava com essa brincadeira em seu Star Wars e tudo que saía derivado da franquia, como jogos, livros e animações, poderia pertencer ao cânon do universo dos jedi. Porém, bem antes de todo esse hype, os diretores autorais brincavam de deuses e sempre colocavam que suas obras nada mais eram que narrativas longuíssimas divididas em vários capítulos. Mesmo não sendo mais surpreendente, ou inovador, ainda existe outras fórmulas para trabalhar um universo compartilhado? Por mais que a DC e até a Universal (vide o projeto de um universo compartilhado de monstros) tente esse tipo de processo, quem resolveu correr por fora foi o diretor indiano que adora surpresas e reviravoltas espetaculares: M. Night Shyamalan.

Em Vidro (Glass – 2019), Shyamalan tenta pôr em prática um sonho de anos: uma trilogia. O diretor nos provoca e quer que embarquemos numa continuação do excelente Fragmentado (Split – 2017) e do já clássico Corpo Fechado (Unbreakable – 2000). Nessa soma, o filme fecha a trilogia, dando ar HQ aos famosos personagens dos outros dois filmes. Com um enredo fortemente baseado nas suas referências de quadrinhos, e na sua grande capacidade de subverter o sobrenatural, começamos a vislumbrar na tela o gostinho deixado no final de Fragmentado. Assim, a trajetória do controverso Kevin Wendell Crumb (James McAvoy) e suas díspares personalidades, se encontram com os personagens de Corpo Fechado. Primeiro com o justiceiro David Dunn (Bruce Willis), tendo apoio de seu já adulto filho-sidekick, Joseph (Spencer Treat Clark). Em seguida, de forma surpreendente com Elijah Price, o Mr. Glass (Samuel L. Jackson). Obviamente, tudo isso sendo manobrado por novos aspectos e novos personagens. Principalmente, nas mãos da psiquiatra, a doutora Ellie Staple (Sarah Paulson) que surge com a intenção de entender o que torna esses seres tão especiais e de tratá-los de melhor maneira possível. Com um elenco de peso, personagens bem estruturados e um prometido embate entre a Besta e Dunn, não tem o que dar errado. Ainda mais vindo da mão de Shyamalan que escreveu e dirigiu esse capítulo final.

O problema é que nem sempre a canônico sustenta novos passos que queira se dar. Por mais que o diretor tenha a ousadia e, principalmente a boa vontade, em trazer uma já tão aguardada interação entre esses personagens, falta elementos fortes que sustentem não só o coexistência deles, como a própria motivação que os colocam em conflito. O desenrolar do filme, para tornar tudo plausível, cai numa aula monótona de arquétipos e construções de personagens de quadrinhos. A tentativa de subversão do gênero super-herói, nesse sentido, torna momentos do filme arrastados e até mesmo clichês.

Além disso, características fortes do diretor ficam aquém num filme que se tinha a obrigação de entregar esses elementos aos espectadores e aos fãs. Brincar com suas marcas registradas, como as intensas reviravoltas, os diálogos ágeis e os jogos espetaculares de câmera seria a forma perfeita para tornar Vidro não só um filme cult, mas sim em uma película grandiosa na sua trajetória como cineasta. É claro que os elementos que tornam M. Night Shyamalan uma grife de respeito, e até polêmica, no cinema contemporâneo estão presentes no filme, mas não com o mesmo ar que já vimos nos dois filmes que antecedem este capitulo final ou até mesmo em outros como Sexto Sentido (The sixth sense – 1999) e Sinais (Signs – 2002). Porém, a obra está longe de ser uma catástrofe como foram consideradas outras como A Vila (The Village – 2004) e A dama da água (Lady in the water – 2006).

Na soma geral, Vidro se sustenta pelas excelentes atuações e pela sobrevida aos personagens marcantes vividos pela tríade de protagonistas, o que pode ser considerado como um erro do Shyamalan, principalmente no roteiro. Bruce Willis, James McAvoy e Samuel L. Jackson conseguiram mais uma vez eternizar frases e cenas que serão reproduzidas dentro da cultura pop. Agora, se teremos mais possibilidades para a criação de um Shyamaland, só o futuro dirá. Até porque, um mundo compartilhado sem a presença de Cole Sear, com sua famosa frase, não tem a mínima graça.

Trailer LEGENDADO

Vidro já está nos cinemas com direção e roteiro de M. Night Shyamalan, e conta com o estrelado elenco com Bruce Willis, James McAvoy e Samuel L. Jackson interpretando o trio de protagonistas deste longa.

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